A irritação de Lênin com Trotsky foi amplamente documentada por um longo período, mas sua suposta exasperação com Stálin surgiu de repente em forma documental enigmática, na primavera e no verão de 1923. A peça central ficaria conhecida como o Testamento de Lênin (zaveschánie) e foi apresentada pela esposa deste Nadejda Krúpskaia, com a ajuda, ou conluio, das mulheres que trabalhavam para Lênin, especialmente Maria Volóditcheva e Lídia Fotíieva, a chefe da secretaria do líder bolchevique. Não subsistem originais dos documentos mais importantes atribuídos a Lênin (que não tinham o título de “testamento” — na verdade, não tinham nenhum título quando vieram à tona pela primeira vez). Sua autenticidade nunca foi provada, como demonstrou um estudioso russo num exame escrupulosamente detalhado. Ele argumenta, corretamente, que, a menos que apareçam provas documentais persuasivas que corroborem que Lênin ditou essas palavras, temos de tratar sua autoria com cautela. Dito isso, o fato é que esses documentos — tenham derivado ou não das palavras do próprio Lênin e, em caso afirmativo, de que forma — se tornaram uma realidade na vida política soviética e, em particular, na vida de Stálin. Analisaremos, nesta empreitada, os documentos atribuídos a Lênin não por suas supostas datas de ditado, mas pelas datas e pelo contexto em que foram divulgados e, sobretudo, por suas consequências. Sua frase fundamental — “remover Stálin” — assombraria eventualmente a Eurásia Soviética e o resto do mundo, mas, em primeira instância, assombraria o próprio Stálin.
[DIGITAL] Em Defesa de Stalin - O "Testamento" de Lênin - Klaus Scarmeloto
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